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Não Tenho Tempo!



Sabes meu filho, até hoje não tive tempo para brincar contigo... Arranjei tempo para tudo, menos para te ver crescer! Nunca joguei contigo dominó, damas, xadrez ou batalha naval... Eu percebo que tu me procuras, mas sabes meu filho, eu sou muito importante e não tenho tempo! Sou importante para números, convites sociais e toda uma série de compromissos inadiáveis! Como largar tudo isto para ir brincar contigo? Não... não tenho tempo!

Um dia trouxeste o teu caderno escolar para eu ver, e ficaste ao meu lado. Lembras-te? Não te dei atenção e continuei a ler o jornal. Porque afinal, afinal os problemas internacionais são mais sérios do que os da minha casa! Nunca vi os teus livros e nem conheço a tua professora. Nem me lembro qual foi a tua primeira palavra! Mas tu sabes eu não tenho tempo! De que adianta saber as mínimas coisas a teu respeito, se eu tenho outras grandes coisas a saber?

É incrível... como tu cresceste! Estás tão alto! Nem tinha reparado nisso! Aliás, eu quase que não reparo em nada... E na vida agitada, quando tenho tempo, prefiro usá-lo lá fora, porque aqui fico calado diante da televisão!

Porquê? Porque a televisão é importante e informa-me muito!

Sabes meu filho, a última vez que tive tempo para ti, foi numa noite de amor com a tua mãe! Eu sei que tu te queixas, eu sei que tu sentes a falta duma palavra, duma pergunta amiga, duma brincadeira, dum chuto na tua bola... Mas eu não tenho tempo! Eu sei que sentes a falta de um abraço e de um sorriso, de um passeio a pé, de ir até ao quiosque, ao fundo da rua comprar um jornal, uma revista... Mas sabes há quanto tempo eu não ando a pé na rua? Não tenho tempo! Mas tu entendes, eu sou um homem importante. Tenho de dar atenção a muita gente, eu dependo delas! Meu filho, tu não entendes nada de comércio! Na realidade eu sou um homem sem tempo! Eu sei que tu ficas triste, porque as poucas vezes que falamos, é um monólogo: Só eu é que falo!

Eu quero silêncio! Quero sossego, e tu tens a péssima mania de querer brincar com a gente! Tens a mania de saltar para os braços dos outros! Filho eu não tenho tempo para te abraçar! Não tenho tempo para conversas e brincadeiras de crianças!

Filho, o que é que tu percebes de computadores, comunicação, cibernética, racionalismo? Tu sabes quem é Descartes e Kant? Como é que eu vou parar para falar contigo? Sabes filho, não tenho tempo! Mas o pior de tudo... o pior de tudo é que se tu morresses agora, já, neste instante... eu ficava com um peso na consciência!... Porque até hoje... até hoje não arranjei tempo para brincar contigo! E na outra vida, Deus não terá tempo de me deixar pelo menos... VER-TE!

(Original de Neimar de Barros / Adaptação e Voz de Vítor de Sousa)

Comentários

  1. As minhas lágrimas rolaram pelo rosto.....
    Acho q nao é preciso dizer mais nada!

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  2. De facto este post é uma boa bofetada na cara de mto boa gente q anda por aí! Este é um clamor pra quem queira ouvir!

    ResponderEliminar
  3. Bonita descrição! Mas é uma situação muitas vezes inevitável nos dias de hoje em que o lufa-lufa, para prover ao sustento quotidiano, obriga os pais a não ter a devida atenção aos seus filhos. E a prova disso mesmo é o facto de cada vez mais, os infantários e escolas, estarem a tornar-se depósito de crianças. Não será o caso deste senhor VIP de que fala a história, por atribuir a si próprio demasiada importância, para dar atenção ao seu filhote. Este é um caso diametralmente oposto daqueles que, infelizmente, não têm outra solução. Talvez a contrapartida para estes casos, resida precisamente no carinho que foi dado pelos meus pais aos meus filhos e sermos nós agora a fazer o mesmo aos nossos netos para colmatar as eventuais falhas dos seus progenitores.
    E uma pergunta se impõe: de quem é a culpa desta situação?!

    ResponderEliminar
  4. Por outro lado, o número de filhos tornou-se menor e resulta, normalmente, de uma decisão mais consciente e planeada. O investimento das famílias e da sociedade nas/os crianças/adolescentes tende a tornar-se maior. Paradoxalmente, os adultos tendem a ter, cada vez menos, tempo para estar com os filhos.

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